domingo, 2 de setembro de 2018

Saber escutar - Paulo Freire

Os sistemas de avaliação  pedagógica de alunos e de professores vêm  se assumindo cada vez mais como discursos verticais, de cima  para baixo, mas insistindo em  passar por democráticos. A questão que se coloca a nós, enquanto professores e alunos críticos e amorosos da liberdade,  não é, naturalmente, ficar contra a avaliação,  de resto necessária, mas resistir aos métodos silenciadores com  que ela vem  sendo às  vezes realizada. A questão que se coloca a nós é lutar em  favor  da compreensão e da prática da avaliação enquanto instrumento de apreciação  do que fazer  de sujeitos críticos a serviço, por isso mesmo, da libertação e não da  domesticação. Avaliação em  que se estimule o falar a como  caminho do falar com. No processo  da fala e da escuta a disciplina do silêncio a ser assumido com  rigor e a seu tempo pelos sujeitos que falam  e escutam  é  um sine qua da comunicação dialógica. O primeiro sinal de que o sujeito que fala sabe  escutar é a demonstração de sua capacidade de controlar não só a necessidade de dizer  a sua palavra, que é um  direito, mas também o gosto pessoal, profundamente respeitável, de  expressá-la. Quem  tem  o que dizer tem igualmente o direito e o dever de dize-lo.  É preciso, porém,  que quem  tem  o que dizer saiba, sem  sombra de dúvida, não ser o único ou a única a ter o que dizer. Mais ainda, que o que tem  a dizer não é necessariamente,  por mais importante que seja, a verdade alvissareira por todos esperada. É preciso que quem  tem  o que dizer saiba, sem  dúvida nenhuma, que, sem  escutar o que quem  escuta tem  igualmente a dizer, termina por esgotar a sua capacidade de dizer por muito  ter dito sem  nada ou quase nada ter escutado. Por isso é que, acrescento, quem  tem  o que dizer deve assumir o dever de motivar, de desafiar quem escuta, no sentido de que, quem  escuta diga, fale, responda. É intolerável o direito que se dá a si mesmo o educador autoritário de comportar-se como proprietário da verdade de que se apossa  e do tempo próprio  pois o tempo de quem  escuta é o seu, o tempo de sua fala. Sua fala, por isso mesmo, se dá num  espaço silenciado e não num espaço com ou sem  silêncio. Ao contrário, o espaço do educador democrático, que aprende a falar escutando, é cortado pelo silêncio intermitente de quem, falando, cala para escutar a quem,  silencioso, e não silenciado, fala. A importância do silêncio no espaço da comunicação é fundamental. De um  lado, me proporciona que, ao escutar, como  sujeito  e não como  objeto, a fala comunicante de alguém  , procure  entrar no movimento interno do seu pensamento, virando linguagem, de outro, torna possível a quem  fala, realmente comprometido com  comunicar e não fazer puros comunicados, escutar a indagação,  a dúvida, a criação  de quem  escutou. Fora disso, fenece a comunicação.

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